terça-feira, 24 de janeiro de 2012

PALAVRÕES TAMBÉM SÃO IMPORTANTES


Os palavrões não nasceram por acaso. São recursos
extremamente válidos e criativos para prover nosso vocabulário de
expressões que traduzem com a maior fidelidade, nossos mais fortes
e genuínos sentimentos. É o povo fazendo sua língua. Como o Latim
Vulgar, será esse Português Vulgar que vingará plenamente um dia.

Sem que isso signifique a "vulgarização" do idioma, mas apenas sua maior
aproximação com a gente simples das ruas e dos escritórios,
seus sentimentos, suas emoções, seu jeito, sua índole.

"Pra caralho", por exemplo.

Qual expressão traduz melhor a idéia de muita quantidade do que
"Pra caralho"? "Pra caralho" tende ao infinito, é quase uma
expressão matemática.

A Via- Láctea tem estrelas pra caralho, o Sol é quente pra caralho, o
Universo é antigo pra caralho, eu gosto de cerveja pra caralho, entende?

No gênero do "Pra caralho", mas, no caso, expressando a mais absoluta
negação, está o famoso "Nem fodendo!". O "Não, não e não!", assim como o
"Absolutamente Não" já soam sem nenhuma credibilidade.

O "Nem fodendo" é irretorquível, e liquida o assunto.

Te libera, com a consciência tranqüila, para outras atividades
de maior interesse em sua vida.
Aquele filho pentelho de 17 anos te atormenta pedindo o carro pra
ir surfar no litoral? Não perca tempo nem paciência. Solte logo
um definitivo "Marquinhos, presta atenção, filho querido, NEM FODENDO!".
O impertinente se manca na hora e vai pro Shopping se encontrar com a
turma numa boa e você fecha os olhos e volta a curtir o CD do Paulinho da Viola.

Por sua vez, o "porra nenhuma!" atendeu tão plenamente às
situações onde nosso ego exigia, não só a definição de uma negação, mas
também o justo escárnio contra descarados blefes, que hoje é totalmente
impossível imaginar que possamos viver sem ele em nosso cotidiano
profissional.

Como comentar a bravata daquele chefe idiota senão com um "é
PhD porra nenhuma!", ou "ele redigiu aquele relatório sozinho
porra nenhuma!". O "porra nenhuma", como vocês podem ver, nos
provê sensações de incrível bem estar interior. É como se
estivéssemos fazendo a tardia e justa denúncia pública de um canalha.

Há outros palavrões igualmente clássicos. Pense na sonoridade de um
"Puta-que-pariu!", ou seu correlato "Puta-que-o-pariu!", falados
assim, cadenciadamente, sílaba por sílaba.

Diante de uma notícia irritante qualquer um "puta-que-o-pariu!"
dito assim te coloca outra vez em teu eixo. Teus neurônios têm o devido
tempo e clima para se reorganizar e sacar a atitude que te permitirá
dar um merecido troco ou te safar de maiores dores de cabeça.

E o que dizer de nosso famoso "vai tomar no cu!"?

E sua maravilhosa e reforçadora derivação "vai tomar no meio do
seu cu!". Você já imaginou o bem que alguém faz a si próprio, e aos
seus, quando, passado o limite do suportável, se dirige ao canalha
de seu interlocutor e solta:

"Chega! Vai tomar no meio do seu cu!".

Pronto, você retomou as rédeas de sua vida, sua auto-estima.
Desabotoa a camisa e sai à rua, vento batendo na face, olhar
firme, Cabeça erguida, um delicioso sorriso de vitória e renovado
amor-íntimo nos lábios.

E seria tremendamente injusto não registrar aqui a expressão
de maior poder de definição do Português Vulgar: "Fodeu!".
E sua derivação mais avassaladora ainda:

"Fodeu de vez!".

Você conhece definição mais exata, pungente e arrasadora para
uma situação que atingiu o grau máximo imaginável de ameaçadora
complicação?


Expressão, inclusive, que, uma vez proferida, insere seu autor em todo um
providencial contexto interior de alerta e auto-defesa.
Algo assim como quando você está dirigindo bêbado, sem documentos
do carro e sem carteira de habilitação e ouve uma sirene de polícia
atrás de você mandando você parar:
O que você fala? "Fodeu de vez!".

Sem contar que o nível de stress de uma pessoa é inversamente proporcional à quantidade de "foda-se!" que ela fala.


Existe algo mais libertário do que o conceito do "foda-se!"?
O "foda-se!" aumenta minha auto-estima, me torna uma pessoa melhor.
Reorganiza as coisas. Me liberta.
"Não quer sair comigo? Então foda-se!". "Vai querer decidir
essa merda sozinho(a) mesmo? Então foda- se!".
O direito ao "foda-se!" deveria estar assegurado na Constituição
Federal.
Liberdade, Igualdade, Fraternidade e Foda-se

(Luís Fernando Verissimo)

Nenhum comentário:

Postar um comentário